segunda-feira, 17 de dezembro de 2007

MUSEU DO VAZIO - Ainda o vazio na 28a. Bienal Internacional de São Paulo

Reproduzimos o texto do crítico de arte e curador da Fundação Eva Klabin, Marcio Doctors, em que ele apresenta o projeto curatorial, que ele e Ivo Mesquita apresentaram inicialmente à Fundação Bienal, para a 28a. Bienal Internacional de São Paulo e explica as razões de sua retirada.
Como noticiado na imprensa, o projeto não foi aceito, Marcio Doctors se afastou e Ivo Mesquita assumiu a Bienal do Vazio.
E a polêmica se instalou entre críticos, curadores, galeristas e até artistas (a última ponta da corda do mercado de arte e a menos importante ao que tudo tem indicado até o momento...).
O projeto parece até interessante - um momento para refletir (em 2008) e um momento para realizar (em 2010), mas não foi aceito pela Fundação Bienal que só se comprometeu com o vazio...
Este texto de Marcio Doctors foi publicado pela Folha, em 14/11/2007.


Lalau Mayrink. Vazio na Bienal 2. 2007
O vazio não deve ser visto como o nada

MARCIO DOCTORS, ESPECIAL PARA A FOLHA.

Como estive envolvido durante dois meses nas negociações da 28ª Bienal Internacional de São Paulo, gostaria de tornar pública minha participação neste processo e expressar meu ponto de vista a respeito do projeto e das soluções que eu e Ivo Mesquita apresentamos, visando solucionar o impasse em que a Bienal se encontra. Ao juntar esforços e dividir a curadoria, nossa intenção era enfrentar a falta de tempo que teríamos para a realização da próxima Bienal . Após análise dos dois anteprojetos, decidimos juntá-los e propor uma conferência e uma exposição, cujo tema seria o vazio. Nossa primeira idéia foi a de manter a conferência, nos moldes tal como está sendo divulgado, e uma exposição sobre o vazio no segundo andar do Pavilhão. Como as negociações avançavam lentamente para o pouco tempo que restava e como ficava cada vez mais evidente que havia limitações financeiras que inviabilizariam os custos de uma Bienal "completa", julgamos que seria oportuno dividir a 28ª Bienal em duas etapas: em 2008, uma conferência, e, em 2010, uma exposição. O que ligaria estes dois momentos seria o tema do vazio. Em 2008, a exposição do vazio como manifesto espacial -esta é a razão do segundo andar vazio- e como gesto radical de afirmação de que a Bienal instauraria o vazio para se repensar. Importante: o educativo trabalharia com a idéia do vazio como a energia que permite a invenção na arte; e a conferência incluiria uma linha de trabalho sobre o tema, fortalecendo o conceito da segunda etapa. Em 2010, a exposição sobre o vazio. Preenchendo e justificando o gesto inaugural da primeira etapa e consolidando a pertinência da proposta, a apresentação do vazio como uma instância ativa e não niilista -como o outro que propicia que as coisas aconteçam no processo inventivo da arte. A exposição estaria estruturada em 3 núcleos:
1- O sempre outro. Artistas que não temem o imponderável e o mistério e que buscam na mudança o fio condutor de seu pensamento plástico. Este núcleo teria como centro a artista Lygia Pape.
2- O vazio ativo (Mira Schendel). O vazio como elemento ativo na constituição da obra plástica e do processo de invenção do artista e que garante a dimensão metafísica da obra de arte como imanência e não como transcendência.
3 - Rede de afetos. A arte como forma de dissolver o massacre do cotidiano e estrutura capaz de rearticular as relações do homem com o mundo, ao trazer à superfície da visibilidade, situações que são percebidas como invisíveis.
A Bienal em duas etapas tinha como objetivo imediato resolver as limitações econômicas e de tempo que a Fundação Bienal nos apresentou. Haveria três anos para realizar a 28ª edição de maneira tranqüila e conseqüente. E como objetivo conceitual, explicitar que no processo inventivo da arte o "vazio" não pode e não deve ser confundido com o nada porque é a possibilidade de tornar visível, o invisível. Durante todo o processo de negociação fui buscando soluções que abrissem portas e que permitissem superar as dificuldades porque meu compromisso fundamental é com a Bienal. Na última reunião, o presidente da Fundação Bienal, Manoel Pires da Costa, declarou que não tinha como garantir o projeto da 28ª Bienal em duas etapas e que só poderia se comprometer com a conferência em 2008. Diante deste fato, de fragmentar o projeto original, julguei que seria mais coerente me retirar porque não via sentido dissociar o projeto da conferência e da exposição do segundo andar vazio (2008) de uma exposição sobre o vazio (2010).

2 comentários:

Anônimo disse...

Essa discussão dá pano para manga. Muito bom ter esse assunto no blog

Anônimo disse...

Museu do vazio... Acho que isso é uma constante na história das mostras dos museus brasileiros. Vazio de conceitos, vazio de acervo, vazio de idéias. Será que nos coquetéis de abertura se os copos estiverem vazios ( de champagne) e os pratinhos vazios ( de frituras) os convidados irão entender a 'proposta'?