domingo, 20 de março de 2011

As virgens sacrificadas e um pintor americano

Reação à leitura de “O legado de Jackson Pollock” de Allan Kaprow



Quantas virgens morreram para que Jackson Pollock conseguisse quebrar o charme da tradição europeia ainda dominante na América no início do século 20? O que pode haver em comum entre um balé encenado às vésperas da Primeira Guerra Mundial e um pintor americano na efervescência cultural da Nova York dos anos 40? Allan Kaprow une, nesse ensaio, de uma forma bastante discreta, as virgens do balé russo e a morte de Jackson Pollock, mas a relação entre o pintor e Igor Stravinsky pode ser levada mais adiante.
A sagração da primavera coloca em cena o sacrifício de uma jovem em uma aldeia da antiga Rússia, ritual de fecundação unindo morte e poder criador no mesmo ato.  Pollock, com sua dança em torno da tela, destrói a pintura herdada do velho mundo para, em meados do século 20, criar algo de novo na arte americana.  O seu poder criador, ao invadir, violentar e matar a ‘pintura de cavalete’, gerou técnicas diferentes, novas e instigantes maneiras de ver e de criticar um quadro.
A dança entre morte e fertilidade de Stravinsky foi ligada, mais tarde, à brutalidade do sacrifício da juventude nas trincheiras dos campos de batalha para, finalmente /supostamente, garantir a paz no mundo. Kaprow prevê, no fim de seu ensaio, que o gestual de Pollock, a escala esparramada de suas obras e seu espaço emaranhado diluiriam as fronteiras entre fora e dentro da tela, entre morte e renascimento da pintura, entre arte e vida quotidiana.
                                                                                                        




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